No dia 21/05/2020, a SBDI-1 (Subseção I Especializada em Dissídios Individuais) do TST, após polêmico debate entre os Ministros, julgou o caso de uma bancária que, entre outros pedidos, pleiteou o pagamento de horas extras em razão do tempo despendido com viagens para assistir cursos de treinamento e capacitação.
Primeiramente, para compreendermos os exatos limites da decisão, devemos consignar as premissas fáticas delineadas nos autos pelo Tribunal Regional do Trabalho (Súmula nº 126 do TST):
- havia obrigação de participação nos cursos; e
- os cursos eram realizados em cidade distinta daquela em que os serviços eram prestados (no caso concreto, a empregada trabalhava em Belo Horizonte [MG] e os eventos aconteciam nas cidades do Rio de Janeiro [RJ] e de São Paulo [SP]).
Nesse contexto, a controvérsia diz respeito à possibilidade de ser enquadrado como “tempo à disposição do empregador” o período gasto com viagens para assistir, em outra cidade, cursos obrigatórios, com a consequente integração desse tempo na jornada de trabalho, nos termos do art. 4º, caput, da CLT:
Art. 4º – Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada.
Com efeito, a principal tese defensiva – reiterada numa sustentação oral bastante elogiada pelos Ministros – foi a de que esse tempo de deslocamento até o local do curso seria equivalente ao trajeto “residência-trabalho-residência”, período não computado na jornada de trabalho.
Contudo, o entendimento vencedor na ocasião foi o de que a “logística”, a “dinâmica”, que se exige para uma viagem de avião não pode ser equiparada àquela envolvida no trajeto “residência-trabalho-residência”, por ser notadamente mais complexa, motivo pelo qual deve ser reconhecida a integração do período ora discutido na jornada de trabalho, exceto em relação aos trechos residência-aeroporto e aeroporto-hotel – esses sim poderiam ser equiparados ao trajeto “residência-trabalho-residência”.
Assim, o tempo total do voo (que é desde o fechamento das portas do avião até o término do desembarque) integra a jornada de trabalho. Ocorre o mesmo em relação ao tempo de espera no aeroporto; mas, nesse caso, o período é limitado a uma hora por trecho, na medida em que esse é o tempo regulamentado como necessário para realização do check-in e dos demais procedimentos de embarque.
Nesse contexto, a SBDI-1 do TST conheceu e deu provimento aos Embargos da reclamante para determinar a inclusão do tempo de voo e no aeroporto (limitado a uma hora por trecho) na jornada de trabalho, com o consequente pagamento das horas extras nos dias em que houve extrapolação da jornada de trabalho.
Esse precedente é importantíssimo, por se tratar de decisão da SBDI-1 do TST, de modo que pode ser utilizado como fundamento de divergência jurisprudencial em Recurso de Revista (artigo 896, alíneas “a” e “b”, da CLT)e em Embargos (art. 894, inciso II, da CLT).
Processo: TST-E-RR-770-74.2011.5.03.0106, SBDI-I, Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Redator Ministro designado para redação do acórdão: Alexandre Luiz Ramos, julgamento em 21/05/2020 (acórdão pendente de publicação).
Artigo escrito por Murilo Soares, professor de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho; analista da área Judiciária do TST, lotado em gabinete de Ministro e atuando na análise e confecção de minutas de votos e decisões monocráticas em recursos de revista, agravos de instrumento, agravos e embargos de declaração.
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